domingo, 7 de fevereiro de 2010

Nandita


Tinha sido padeira, a Fininha, agora era epiléptica, davam-lhe ataques, sobretudo quando se enervava, caía para o chão, esticava muito o corpo e torcia as mãos num sentido que não dava jeito, revirava os olhos para dentro de si e cerrava a boca com tamanha força que parecia que receava que a fala lhe fugisse, mas a boca tinha que ser aberta para não comer a língua, por isso era-lhe posto sempre qualquer coisa entre os dentes para evitar a fechadura da boca. O marido da Finhinha era o senhor Luís, um homem pacato e sorridente que saía todos os dias de madrugada com a marmita na mão a caminho da fábrica de metalurgia lá para os lados da Circunvalação.


A Fininha e o senhor Luís tinham dois filhos, um casal, a Nanda e o Luís. O rapaz era uma cópia perfeita do pai, sempre de dentes arreganhados, levava a vida o melhor que podia, depois de uns anos de estudo esforçado foi trabalhar para ganhar algum dinheiro, que entregava todo em casa. A Nanda, era a grande aposta da família, tinha uns longos cabelos loiros, olhos muito azuis, pele clarinha e corpo proporcionado, não era gorda nem era magra, era aquilo que se esperava de uma rapariga que era considerada a mais bonita do prédio e que a mãe, a Fininha, trazia sempre muito arranjadinha, a sua Nandita, como ela a tratava, era para aí uns seis anos mais velha que eu e era a grande mandona das brincadeiras da miudagem. A Nandita era um misto de menina bem comportada, sempre com um sorriso na boca, muito amável e prestável e de menina malvada que mantinha o seu adorável sorriso quando os miúdos eram derrotados nas brincadeiras em que apostavam ganhar.


A minha mãe sentia-se mais segura em deixar-me ir brincar para a rua quando lá estava a Nandita, mas eu sentia-me intimidada, aquela vontade incontrolável de partilhar das brincadeiras de rua esmorecia, a minha mãe insistia para eu ir, eu encolhia-me, até que a minha mãe tomava a pior das decisões, chamava a Nandita e perguntava-lhe se me deixava ir brincar com ela, e eu lá acabava por me juntar ao grupo, muito envergonhada, esperando as ordens da Nandita.

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