sábado, 14 de novembro de 2009

Numa tarde de Julho quando regressava a casa


Às vezes tinha dúvidas se estaria viva ou morta, ficava muito quieta e tentava escutar o vaivém do pouco ar que usava, continuava a respirar, estava viva, mas era como se estivesse morta. Quase todos os dias desejava que morresse, porque já não aguentava ver o seu corpo imóvel a apodrecer ao meu lado, evitava tocar naquela carne morna branca amarelada e na cabeleira rasa e desgrenhada. A minha mãe insistia para que eu falasse com a Bibi, a custo colocava a minha cabeça em frente ao seu olhar mortiço e sem saber bem o que dizer a uma moribunda, perguntava-lhe como se sentia. A Bibi mexia os lábios, mas da sua boca não saía qualquer som, desistia deste esforço infrutífero e olhava-me. Eu não necessitava de qualquer palavra sua, bastava-me a voz dos seus olhos que repetia incessantemente tudo o que eu já tinha ouvido milhares de vezes.


Numa tarde de Julho, quando regressava a casa do liceu, a minha mãe disse-me que a Bibi estava à minha espera, precisava de ver-me antes de morrer. Aproximei-me dela, coloquei a minha cabeça em frente à sua e chamei-a, “Bibi...Bibi...” ela abriu os olhos e fitou-me, e com o maior esforço deste mundo conseguiu emitir uns sons que deveria corresponder a palavras que eu não consegui entender, mas que traduzi por “Gosto muito de ti”. Fechou os olhos e morreu.

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